Junho de 2012 começou do mesmo jeito que os outros meses de outros e desse ano. Mas no primeiro dia do mês, completou-se três anos que o voo Air France 447 desapareceu no Oceano Atlântico, para ser localizado quase dois anos depois. Duzentas e vinte e oito pessoas estavam a bordo. Quantas histórias deixaram de ser escritas por causa desse acidente? E pensar que tudo poderia ter sido evitado. Voltando no tempo em um “momento flashback”, podemos entender alguns pedaços da tragédia:
Há quase cinco anos, uma série de falhas do sistema ADIRU (Air Data Inertial Reference Unit, ou Unidade de Referência Inercial e de Dados Aéreos) quase causou mais acidentes, tão sérios quanto o acidente do vôo 447. Os A330 e A340 (para quem não sabe, são os mesmos projetos, com motores e configurações diferentes) são equipados com três unidades ADIRU independentes e redundantes, que fornecem aos sistemas eletrônicos os parâmetros básicos que monitoram dados como atitude, proas e velocidades, como um GPS. O sistema já apresentou falhas em dois eventos envolvendo jatos A330, ambos das operadoras australianas Qantas e Jetstar, esta afiliada da primeira. Os dois ocorreram no segundo semestre do ano de 2008, justamente em altitude de cruzeiro, durante mau tempo, quase provocando desastres fatais.
No primeiro, ocorrido em outubro de 2008, um A330-300 com 313 ocupantes voava de Cingapura para a Austrália. Uma hora após a partida, o ADIRU 1 passou a indicar parâmetros errôneos, mostrando que o avião estava em um ângulo de voo diferente do realmente voado. A tripulação pensou que o problema se resolveria se desligasse o ADIRU 1 e acionasse o sistema de back-up, que desconsidera a leitura discrepante dentre as três unidades e valida as duas que apresentam a mesma leitura. No entanto, mesmo com o ADIRU 1 desligado, a falta de sincronia entre os três sistemas fez com que o sistema central da aeronave continuasse interpretando dados equivocados. Ao invés de considerar os dados dos ADIRUs 2 e 3 como sendo os corretos, o sistema desconsiderou os dados das unidades que funcionavam normalmente e validou como corretos os parâmetros do ADIRU 1, justamente o que apresentava leitura espúria. A informação, repassada automaticamente pelos sistemas eletrônicos de comando, fez com que a aeronave mergulhasse bruscamente. A muito custo, e com grande perícia, o controle foi retomado pelos pilotos. Ainda assim, o sistema voltou a desconsiderar os ADIRUs 2 e 3 e a aeronave mergulhou por uma segunda vez. Novamente, os tripulantes retomaram o controle, declararam emergência e conseguiram pousar. Trinta e seis ocupantes ficaram feridos, 12 deles com gravidade.
No segundo incidente, ocorrido em dezembro de 2008, a falha no ADIRU 1 provocou a desconexão do piloto automático e obrigou um pouso de emergência, felizmente sem feridos.
Considerados na verdade acidentes, embora sem perda total das aeronaves, foram graves o suficiente para provocar um alerta da Agência Européia para a Segurança da Aviação (EASA). A EASA e a Airbus passaram então a recomendar que os operadores do jato alterassem procedimentos quando em caso de falha destes sistemas. Em razão dos episódios, a EASA lançou um alerta em janeiro de 2009, recomendando aos pilotos de A330 e A340 para, em caso de falha no ADIRU, não apenas desligá-lo, mas desconectá-lo completamente. Tudo isso tem a ver com as poucas transcrições da caixa preta da aeronave, instruções que foram reveladas em doses homeopáticas. Mas não significa que foram as casas principais.
Outra provável causa é a falta de habilidade dos pilotos em controlar a aeronave durante os últimos minutos de voo. Com base nas transcrições, a aeronave começou a subir por ordem dos co-pilotos em comando, pois era horário de descanso do comandante. O alarme de stall soou na cabine 75 vezes (quando a aeronave estolou pela primeira vez), pois a aeronave chegou a 93 nós de velocidade. Após verificar a velocidade indicada, os pilotos resolvem descer. Vale lembrar que, antes do stall e da subida, os tubos pitot congelaram, e só voltaram a funcionar após a descida da aeronave, graças ao efeito de descongelamento. A aeronave ganha velocidade, até chegar a 223 nós, onde os pilotos conseguiram restabelecer o controle.
Para resumir as transcrições, até a queda da aeronave, o nariz permaneceu apontado para cima, e os manetes em TOGA (posição de decolagem). Os co-pilotos estavam totalmente confusos, e apenas o comandante parecia ter noção da situação da aeronave, que caiu com seu nariz apontado para cima, a uma velocidade horizontal de 100 nós, e uma razão de descida de 3050 pés por minuto.
As caixas pretas revelaram que um dos co-pilotos agiu na emoção, pois quando o avião entrou em stall pela primeira vez, ao invés de empurrar o joystick de controle (que faria a aeronave descer), puxou o seu joystick, na tentativa de fazer a aeronave subir. O outro co-piloto precisou intervir para recuperar a condição inicial da aeronave.
Outra revelação foi que, talvez atordoados por causa da situação ou até mesmo falta de experiência em situações estremas como a do voo (clima em especial), os co-pilotos não sabiam como lidar com a situação vigente, precisando chamar o comandante da aeronave para “salvá-los” desse problema. Mas é lógico que o relatório irá culpar parcialmente ou até mesmo totalmente os pilotos, já que pilotos mortos ou desaparecidos em alto mar não podem se defender. Mas se não forem totalmente culpados pela queda da aeronave, o congelamento dos tubos pitot poderá ser o fator determinante para o mau funcionamento dos sistemas da aeronave. É esperar para ver.
Deixo uma pergunta no ar para vocês: O que vocês, caros leitores, acham que aconteceu realmente na cabine de comando? Algum fato mencionado acima lhe convenceu ou lhe fez raciocinar sobre a causa dessa tragédia? Deixe sua opinião nos comentários.
Créditos: Antonio Ribeiro
*Texto retirado de canalpiloto.com.br
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